Uma Política Económica e Financeira Consistente

Existe um consenso em torno do objectivo de se atingir, para a economia portuguesa, um desenvolvimento sustentado, o que, na perspectiva de autores como Ranis e Fei, corresponderia à ultrapassagem do “commercialization point”, atingindo a produtividade marginal e os salários dos sectores tradicionais valores semelhantes aos registados nos sectores modernos.

Ora, manda a verdade reconhecer que tal desiderato só pode ser obtido por duas vias:

  1. a qualificação da mão-de-obra, o que, no caso português, implicaria, sobretudo, uma crescente aposta no ensino técnico e especializado;
  2. a mobilização de poupanças (endógenas ou exógenas) para investimento reprodutivo, em simultâneo com a concretização de programas adequados de investimento em infraestruturas de enquadramento.

É sabido que a primeira via, embora se apresente da maior importância numa perspectiva de médio e longo prazos, não produz efeitos significativos no curto prazo.

Por outro lado, a aposta na qualificação da mão-de-obra implica, sempre e em qualquer caso, que se avance, simultaneamente, pela segunda via, i.e., pela via da mobilização de poupanças para investimento reprodutivo, acompanhada da concretização de programas de investimento em infraestruturas de enquadramento.

Daí que se afigure da maior relevância a questão da necessidade de se procurar definir uma política económica e financeira incentivadora do investimento produtivo, a par de uma política orientada para a expansão dos programas de investimento público, recorrendo, sempre que possível, à metodologia PFI/ P.P.P. (Private Finance Initiative/ Public Private Project).

A Aposta no Investimento

Alguns responsáveis políticos têm vindo – e bem – a afirmar ser preciso impor uma política de rigor orçamental, controlando-se de forma mais apertada a despesa pública.

Todavia, quando se lhes pergunta em que domínios faria sentido actuar tendo em vista reduzir o défice orçamental, em vez de proporem esta ou aquela redução nas despesas correntes, propõem o mais fácil, i.e., a não concretização do projecto TGV ou do aeroporto da OTA, que o mesmo é dizer, limitam-se a apontar como solução do problema a realização de cortes nos programas de investimento público.

Ora, sem prejuízo de ser necessário seleccionar os projectos de investimento público que interessam, importaria, isso sim, que se dissesse, de forma clara e concisa, quais os domínios em que seria prioritário actuar, numa perspectiva de contenção das despesas públicas correntes, tanto mais que é sabido que, num quadro de desaceleração do crescimento económico, o recurso a cortes no investimento público produz efeitos indutores negativos no nível de actividade, o que só poderá contribuir para agravar ainda mais a tendência para a desaceleração.

Por outro lado, alguns economistas e dirigentes políticos parecem estar convencidos de que, mesmo quando se recorre ao “project finance”, em articulação com a iniciativa privada, se está, em qualquer caso, a contribuir para o agravamento, a médio e longo prazos, do défice orçamental e da Dívida Pública.

Tal não tem que acontecer necessariamente.
O recurso à metodologia PFI/P.P.P. pode levar à mobilização de recursos junto do Sistema Financeiro a partir das receitas esperadas do consórcio privado que deverá vir a explorar esta ou aquela concessão, o que, quanto muito, equivalerá à renúncia por parte do Estado da obtenção de uma receita futura adicional, contra a realização pelos privados de um investimento infraestrutural.

Mas, para além da questão do investimento público (associado às infraestruturas de enquadramento), haverá, também, que pensar na indispensabilidade de se incentivar o investimento privado.

Não sendo suficiente a poupança endógena (que o mesmo é dizer, existindo limitações à capacidade de auto-financiamento do tecido empresarial nacional, mesmo com recurso ao sistema financeiro interno), haverá, também, que recorrer ao investimento alógeno.

Da constatação desta necessidade resulta a importância de um quadro fiscal que incentive o investimento privado (nacional e estrangeiro), o que passa, inevitavelmente, pela introdução de reajustamentos na legislação relativa às mais-valias, como no que se refere às garantias que devem ser dadas aos contribuintes quanto à quebra do sigilo bancário e à própria redução do IRC.

Sendo Portugal uma pequena economia aberta que aceitou o desafio de integração num espaço europeu alargado, a questão do apoio à internacionalização das empresas nacionais tem que ser encarada numa perspectiva de aposta numa estratégia consistente de desenvolvimento das nossas estruturas produtivas, assente no conceito de vantagens competitivas dinâmicas.

E, de acordo com esta perspectiva, mais importante do que procurar explicar, por exemplo, o crescimento do PIB a partir da quantidade de mão-de-obra, do “”stock” de capital e do coeficiente capital/ produto, será, isso sim, compreender o “impacto” das variações/ tendências registadas nestas variáveis explicativas no nível de actividade económica e bem assim no nível de vida da população.

Os paradigmas de Scherer e de Porter (aplicados às vantagens competitivas industriais e à especialização intra e inter-industrial) constituem uma inegável contribuição positiva para a percepção do que se apresenta relevante na definição de uma estratégia de desenvolvimento consistente para a nossa economia.

Todavia, apresentam algumas insuficiências, limitando o campo das opções a uma perspectiva, essencialmente, defensiva, de acordo com a qual não faria (nem fará) sentido abrir mão de vantagens competitivas já existentes ao nível de certos sectores tradicionais (como, por exemplo, ao nível dos sectores dos têxteis e vestuário).

Importa saber assumir uma perspectiva mais arrojada, apostando-se, designadamente, em sectores ligados às novas tecnologias como, por exemplo, os das telecomunicações, informática, biotecnologia e energia renovável.

Para tal, haverá não apenas que definir quadros de incentivo financeiro e fiscal apropriados, como também que promover a investigação científica, bem como as necessárias parcerias estratégicas, procurando-se, por essa via, superar as limitações decorrentes da dimensão do nosso mercado interno.

A Estabilidade Político-Social Como Pressuposto do Desenvolvimento

Há quem, deliberadamente, confunda a estabilidade com apatia.

Estabilidade não implica estagnação.

Mas, o desenvolvimento consistente pressupõe, isso sim, alguma estabilidade político-social.

Se não existir bom-senso por parte dos parceiros sociais poder-se-á vir a assistir a fortes pressões inflacionistas, as quais implicarão a adopção de políticas de controlo da procura global, com efeitos indutores negativos no nível de actividade económica e na taxa de desemprego.

Uma política económica e financeira consistente, actuando ao nível da componente psicológica do investimento (políticas de estabilização) como ao nível do ensino técnico e especializado e das infraestruturas de enquadramento (políticas estruturais), a par da modernização dos sectores tradicionais com vantagens competitivas (recorrendo ao “design” e às novas técnicas de “marketing”) e de uma aposta nos sectores de ponta, incorporadores de novas tecnologias (investigação científica/ parcerias estratégicas), constituem a essência de um novo projecto galvanizador que poderíamos designar de estratégia do NOVO DIAMANTE.

O NOVO DIAMANTE assentaria em seis variáveis estratégicas fundamentais: a CONFIANÇA, a FORMAÇÃO, o INVESTIMENTO, a MODERNIZAÇÃO, a INVESTIGAÇÃO e as PARCERIAS ESTRATÉGICAS.

E só actuando de forma integrada e integradora ao nível deste conjunto de variáveis seremos bem sucedidos na nossa aposta de consecução de um modelo de desenvolvimento sustentado para Portugal.

 

O Novo Diamante

 

Setembro de 2001

 

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