Reformar o Sistema Político
Tem sido dito e redito que, por muitos defeitos que a democracia representativa apresente, é sempre preferível o paradigma de sistema participativo ocidental (nas mais diversas versões) à “melhor” das ditaduras.
Mas, tal não significa que não se procure, a cada momento, aperfeiçoar o sistema democrático, ajustando-o às necessidades existentes e compatibilizando-o com a obtenção de níveis mínimos de eficácia política.
Não faz, por exemplo, sentido que se perpetue uma lógica de poder que esteja condicionada a sucessivos actos eleitorais, levando, em muitos casos, a acções governativas ditadas pelas sondagens, com predomínio do curto prazo, em detrimento do longo prazo.
É o que tende a suceder na generalidade dos países europeus, em que em quatro ou cinco anos se realizam quatro actos eleitorais (tendo em conta os mais diversos tipos de eleições), criando condições para que venha a emergir a tentação de que nos fala Ari Aisen: privilegiar-se a adopção de políticas contraccionistas na fase imediatamente pós- eleitoral e de políticas expansionistas na fase imediatamente pré-eleitoral.
E este sistema conduz ao sucessivo adiamento das reformas estruturais, antes criando condições para a emergência de fenómenos populistas, assentes na demagogia e na irresponsabilidade.
O que, por outras palavras, significa que a estabilidade político-social passa a estar, cada vez mais, condicionada aos ciclos económicos, sendo poucos os que procuram concretizar um projecto transformador da sociedade, numa perspectiva de longo prazo.
Logo, vai sendo tempo de se pensar na reforma dos sistemas políticos, procurando compatibilizar a indispensável legitimidade democrática com a eficácia e, por isso mesmo, com a efectiva capacidade reformadora dos Executivos.
Por ouro lado, afigura-se problemática uma situação que conduza à inevitabilidade de sucessivas remodelações parciais do Conselho de Ministros Europeu, resultantes de sucessivos actos eleitorais nos diversos Estados-Membros, complexificando todo e qualquer processo negocial.
Daí que me pareçam essenciais duas reformas, por muito que as mesmas pareçam insignificantes a alguns teóricos que consideram que já pouco ou nada há a fazer nesta caminhada angustiante para a “tragédia colectiva”.
A primeira, consiste em, de futuro, se fazer coincidir as eleições legislativas com as eleições para o Parlamento Europeu.
Penso, inclusive, que seria desejável que todos os Estados- Membros elegessem os respectivos parlamentos nacionais coincidentemente com as eleições para o Parlamento Europeu, ganhando-se em termos de eficácia das instituições e evitando-se sucessivas remodelações parciais nos Conselhos de Ministros, inclusive, nos Conselhos Sectoriais.
Mais, a simultaneidade de actos eleitorais levaria, seguramente, os cidadãos a um maior empenhamento na discussão e na resolução dos problemas europeus, invertendo-se a actual tendência para um crescente divórcio entre o “cidadão nacional” e a Europa supra-nacional ou, se se preferir, multi-nacional.
Por outro lado, o mandato do Parlamento e do próprio Governo passaria de quatro para cinco anos, permitindo uma maior estabilidade política e criando, por conseguinte, algumas condições suplementares para a efectiva concretização de reformas estruturais.
Não há, naturalmente, “bela sem senão”. E, neste caso, importa reconhecer que os ganhos potenciais em estabilidade e em condições para a existência de uma governação reformadora se traduzem, por outro lado, em alguma perda de capacidade fiscalizadora dos Órgãos de Soberania pelos eleitores.
A Segunda – de âmbito comunitário – consistiria na consagração de um sistema bi-Cameral, à semelhança do que sucede nos E.U.A.
Para além do Parlamento Europeu – em larga medida, assente num critério de proporcionalidade demográfica –, deveria existir um Senado, com igual número de Senadores por Estado-Membro, devendo algumas decisões (de maior relevância comunitária) ser, obrigatoriamente, tomadas por maioria nas duas Câmaras.
Compatibilizava-se, na medida do possível, o critério da proporcionalidade demográfica com o critério do respeito pela soberania dos Estados.
Trata-se de pôr em prática duas reformas, uma a nível nacional (e quiçá ao nível dos Estado-Membros da U.E.) e outra a nível comunitário.
Duas reformas muito simples ...
Mas, que poderão, em meu entender, fazer muito mais pelo nosso futuro do que dez Programas de Governo com grandes e patrióticas declarações de intenção sobre a necessidade de reduzir a Administração Pública, aumentar a produtividade e modernizar os Sectores da Saúde e da Educação.
Setembro de 2004
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